Sem acessórios nem som
Escrever só para me livrar
de escrever.
Escrever sem ver, com riscos
sentindo falta dos acompanhamentos
com as mesmas lesmas
e figuras sem força de expressão.
Mas tudo desafina:
o pensamento pesa
tanto quanto o corpo
enquanto corto os conectivos
corto as palavras rentes
com tesoura de jardim
cega e bruta
com facão de mato.
Mas a marca deste corte
tem que ficar
nas palavras que sobraram.
Qualquer coisa do que desapareceu
continuou nas margens, nos talos
no atalho aberto atalhe de foice
no caminh0 de fato.
FREITAS FILHO, A. Máquina de escrever: poesia reunida e revista. Rio de Janeiro. Nova Fronteira, 2003.
Nesse texto, a reflexão sobre o processo criativo aponta para uma concepção de atividade poética que põe em evidência o(a)
- angustiante necessidade de produção, presente em “Escrever só para me livrar/ de escrever”.
- imprevisível percurso da composição, presente em “no atalho aberto a talhe de foice/ no caminho de rato”.
- agressivo trabalho de supressão, presente em “corto as palavras rentes/ com tesoura de jardim/ cega e bruta”.
- inevitável frustração diante do poema, presente em “Mas tudo desafinal. O pensamento pesa tanto quanto o corpo”.
- conflituosa relação com a inspiração, presente em “sentindo falta dos acompanhamentos e figuras sem força de expressão”.
RESOLUÇÃO
O autor se expressa falando que tem que escrever só para se livrar de escrever mesmo sentindo falta dos acompanhamentos e figuras sem força de expressão.
LETRA E